Em meio ao consenso de que o conflito na Ucrânia acendeu uma espécie de alerta global para a importância da independência no setor de defesa, o Brasil ainda analisa quais caminhos seguir e o que será preciso para garantir uma forte capacidade de resposta para os complexos desafios do mundo contemporâneo.
Embora o caso de cada país “dependa muito do seu contexto doméstico”, o Brasil tem dois problemas estruturais dentro de suas Forças Armadas que precisam ser sanados. Em primeiro lugar, “a desconexão com os interesses da sociedade civil”. Em segundo, as “falhas nas políticas de investimento orçamentárias”. O analista apontou que o país consome “mais de 85% do seu orçamento de defesa em gasto com pessoal”.
Foi o que explicou o especialista em ciência política e relações internacionais Lucas Rezende, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED), em entrevista ao site Sputnik News.
“As nossas Forças Armadas gastam errado e gastam sem consultar a sociedade. O caminho deveria ser inverso. A sociedade, por meio dos seus líderes eleitos, deveria se organizar e elaborar uma política nacional de defesa, uma estratégia que seria passada ao Ministério da Defesa e às Forças Armadas”, comentou Lucas Rezende. Entretanto, disse ele, “a coisa no Brasil é invertida”, enfatizando que essa discussão tornou-se fundamental porque o mundo passa por momento de grande tensão.
“O mundo está em guerra”, disse Lucas Rezende, que entende que um determinado cenário de cooperação internacional que existia no pós-Guerra Fria, “principalmente ligado à integração e cooperação internacional”, foi rompido. “É natural que se incrementem os gastos em defesa”, comentou.
E qual é o caminho para o Brasil?
Para reativar o setor de defesa do Brasil na esteira dos problemas geopolíticos que cercam a nação, o especialistas Lucas Rezende explicou que a solução passa pela expansão das parcerias regionais, sobretudo no âmbito da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Ele entende que existem problemas orçamentários envolvendo o Ministério da Defesa e que, “sim, sobra pouco dinheiro para poder investir na defesa do país”. Mas solucionar esse problema é mais simples, é preciso “reformar as Forças Armadas para poder diminuir consideravelmente o número de militares da ativa”.
O grande desafio, por outro lado, é retomar as parcerias com a Unasul e, em especial, com o Conselho de Defesa Sul-americano (CDS).
A Unasul é uma organização formada pelos 12 países da América do Sul, que está sendo retomada agora após passar por um período de paralisação. É uma união que integra as duas uniões aduaneiras existentes na região, o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a Comunidade Andina de Nações (CAN), como parte de um contínuo processo de integração sul-americana.
“Foi uma experiência quase que única na história recente do Brasil [o CDS], na qual as Forças Armadas implementaram, por meio da cooperação, a política externa brasileira. Isso é fundamental para a defesa nacional brasileira, porque é impossível a gente pensar na nossa defesa exclusivamente, sem pensar na capacidade de defesa que os nossos vizinhos têm”, comentou.
Essa importância com relação aos nossos vizinhos justifica-se em razão dos problemas que o Brasil precisa enfrentar a curto prazo, como o tráfico internacional de drogas e o crime organizado, “que é transnacional e, portanto, atua em diversos países da região”.
